Eisbein bem baiano em Piracaia
Comida Saudável

Eisbein bem baiano em Piracaia


Sempre olhávamos com curiosidade para um restaurante na beira da estrada do Pião a caminho da nossa chácara. Tem cara de boteco fuleiro mesmo, com cores chamativas nas paredes fixadas com tinta a óleo, em  construção precária. Na varanda, mesa de sinuca decorada com cartazes de mulheres seminuas, anúncio de perdeu-se uma mula, encontrou-se um potro, vende-se charrete, aluga-se um pasto. Nome, o restaurante não tem, só me lembro da placa "temos caldo de mocotó e linguiça caseira". Um dia a gente para, prometíamos. 

Neste final de semana que passou coincidiu que já era tarde, estávamos com muita fome e não aguentaríamos até chegar em casa e cozinhar. Nunca paramos para comer na cidade por causa da vira-lata que sempre nos acompanha. Não espero que restaurantes aceitem a Dendê no salão e muitos não têm uma argola onde possamos prendê-la na porta. Então, preferimos sempre cozinhar em casa. Mas ali tinha espaço, um grande quintal gramado, a varanda com mesas de plástico estava vazia, em frente tem uma floresta, de um lado,  um lago e do outro, uma horta com quiabos, temperos, bananeira. Paramos e perguntamos o que tinha para comer. Caldo de mocotó, alguma outra coisa de que não me lembro, e, surpresa,  aizbai. - Tem o que?  - Joelho de porco, a senhora não conhece? respondeu Seu João. - Taí, a gente quer aizbai, seu João. Demora pra sair? - Vinte minutinhos, é que tá congelado. E o arroz,  o Oswaldo, meu irmão, tá terminando de fazer. - Ótimo, a gente espera. Uma cerveja bem gelada, por favor.  


Seu João sacrificado pela malemolência da fotógrafa (que preguiça
de me levantar daqui ... ) 


Enquanto isso, passeamos pelo entorno, a Dendê se comportou, usei o banheiro bem asseado, aproveitei pra espichar os olhos na cozinha, bem limpa, e conversamos com os camaradas que chegaram para uma pinga. Já ficamos sabendo quem tem frango, que faz o melhor queijo de leite cru da região e outras curiosidades. Só ficamos preocupados quando uzomi pegaru carro meio tortinhos, deixando pra trás o papo e a ambientação sonora:  um dvd ao vivo do Reginaldo Rossi, "Garçom, aqui nesta mesa de bar..."


Seu João nos trouxe uma tigela com molho de pimenta fresca que ele mesmo fez com cebola, alho e, se não me engano, cominho. Marcos gostou tanto que comeu puro com farinha. Aproveitou o ensejo e o restaurante vazio para nos contar toda sua trajetória de Ilhéus, na Bahia,  até chegar a este restaurante arrendado no meio do nada, no quilômetro seis da estrada tortuosa que dá no bairro do Pião, que fica  no vinte e dois. Foi garçom no La Casserole e no Gato Que Ri aqui em São Paulo muito tempo atrás, estudou culinária em Poços de Calda, trabalhou na cozinha de um restaurante em Mairiporã, e acabou ali. Ele e o irmão cozinham o que sabem com influência da terrinha e dos lugares por onde passaram. 

Chegou o arroz fresquinho, ele disse que é feito no capricho e com amor e eu não perdi a chance de sugerir a cebolinha verde da horta no lugar no sazon. Sugestão aceita. Desculpou-se pela falta do feijão, que normalmente acompanha o prato, mas tinha acabado, já era tarde. Contou que quer fazer umas tilápias daquele lago e sugeri usar também as folhas de bananeira ali do lado para embrulhá-las e assar na brasa. Disse que sim, sabe fazer e vai fazer, então. Sugeri ainda frango caipira com ora-pro-nobis. - Ô, seria bom, hem, frango eu tenho, mas não tenho ora-pro-nobis. - Por isto, não, deixa comigo.   E chega o prato de aizbai. Derretendo, cheiroso, suculento e com coentro fresco espalhado por cima. - Coentro no joelho, Seu João? Nunca pensei nisso. - Ah, é o toque baiano, coma aí este joelho que eu vou buscar lá em Bom Jesus dos Perdões. Comemos com farinha, molho de pimenta e arroz. E, nossa, como estava bom! Comemos de joelhos, tão enebriados que até esqueci do meu último palpite, mas aqui vai. Não precisa chamar de einsbein, não, Seu João, tão difícil de falar. O eisbeiano  pode ser mesmo joelho de porco com coentros. Sem chucrutes ou mostardas, uma coisa mais alentejana, mais baiana e pronto.  Dá tranquilamente pra três e custa R$ 20,00 com acompanhamentos. Na volta, deixamos lá uma mudinha de ora-pro-nobis e vamos ver no que dá. Aliás, você tem um bom nome para eu sugerir ao restaurante do Seu João? Porcoentros?

Temos caldo de mocotó e joelho de porco com coentros 
Estrada do Pião, entre quilômetro 6 e 7, do lado direito. Tem estacionamento e lugar para deixar bicicletas e cachorros.  
Todo mundo em Piracaia sabe onde é a estrada do Pião




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