Fui comer no Bahia
Comida Saudável

Fui comer no Bahia




No sábado deixamos no aeroporto a Ananda, que já saiu a saracotear de férias. Deu aquela tristeza esquisita que só quem tem filho sabe como é. Já era tarde e a barriga grudava de fome na costela. Marginal parada, zona norte, lembrei: galinhada do Bahia, ueba! Todo mundo já falou dele na imprensa especializada, toda crítica boa está lá emoldurada e são dezenas, mas eu mesma só tinha passado perto. Sem endereço, me lembrava que era em frente ao estádio da Portuguesa. Passa o estádio, entra à direita e a gente já vê placa. Você pode estranhar um pouco, afinal o restaurante fica nos fundos de uma viela com casas muito simples. Pelas janelas abertas para a passagem a gente vê a geladeira, a mesa da cozinha e a televisão das casas vizinhas. As mesas com cadeiras de plástico ficam num terraço coberto com telhas de amianto e plástico verde. Com a chuvinha fina, o chão estava um leguedê danado, mas o lugar ainda estava cheio, animado, barulhento. O cheiro era prenúncio de coisa boa. Aí começa a chegar prato, um atrás do outro. Por um preço único (R$ 25,00) você é servido de um banquete nordestino. Por R$ 27,00 vem o carneiro também. Legumes cozidos, galinhada de verdade ? com pé, pescoço, moela, oveira-, galinha ao molho pardo, farofa, baião-de-dois, arroz, e outras comidinhas. Claro, muito mais do que pedia minha fome melancólica, mas aquilo sufoca qualquer tristeza. Uma cachaça, uma cerveja, uma pimentinha e a alegria vem brotando. O tempero é bom, sente-se o cominho, o grão do coentro, de longe a hortelã, mas tudo bem dosado. E o tal do Bahia esbanja a mesma simpatia e humildade com que deve ter cativado seu público.

O maior orgulho da comida feita por ele, sua irmã e sua mulher

O talento do Seu Raimundo Souza Soares, o Bahia, para o fogão veio naturalmente ainda criança, observando a mãe cozinheira, em Rui Barbosa-BA. Veio para São Paulo em 1975 depois de ter quebrado com negócio de gado (trabalhou de açougueiro, matando boi, mas quebrou mesmo foi comprando e vendendo). Aqui veio ser empregado de numa distribuidora de bebida. Sozinho, saudade de casa, começou a reunir amigos no final de semana pra comer e tomar umas. Principalmente pra tomar umas. Começaram a encher a cabeça do cabra: pô, Bahia, você cozinha bem, por que não monta um restaurante! Já no Canindé, em 1981, fez um puxadinho no quintal de casa e começou não com o restaurante, mas com o forró. Se ele tocava sanfona? Não, o negócio dele era mesmo dançar. A comida veio depois, naturalmente, afinal forró dá uma porra de uma fome (atenção: merde pra francês e porra pra baiano não é palavrão, não senhor) e cozinhar ele sabia. Pois é, o negócio vai muito bem obrigado. Tem até uma mangueira no meio do salão. Claro que Marcos e eu não pudemos deixar de compará-la com a figueira do Rubayat. Cada qual com sua honestidade. E o Bahia tem lá seu charme.

Aqui também tem uma árvore no meio do salão

Como chegamos tarde, o movimento foi fraquejando e deu pra conversar um pouco com o homem alto, sertanejo forte, daqueles que podem catar um boi à unha. Mas também gentil e generoso, afinal me deu sem nenhum ciúme ou hesitação a receita da galinhada e do carneiro ? a buchada de lá também é feita com carneiro e não bode, pois tem maior aceitação, diz ele. De fato, muito boa, com sabor delicado o recheio de sarapatel. Quando já estávamos fora, na viela, lá veio o Bahia me chamar: Olha, eu fiz um cozidinho de encomenda, mas não dá pra fazer cozido de pouco, então quero saber se aceita levar uma marmitinha de presente. Oxente, e eu ia recusar? Quantidade familiar, com pirão e tudo. Foi meu almoço de hoje, bem sortido, bem curtido. Valeu, Bahia! Voltarei.

Uma pequena parte da minha marmitinha de cozido - com carne seca, batata-doce, maxixe, repolho, couve, milho, banana, cenoura... E ainda tinha o pirão.

Ressaltando a facilidade de se fazer a galinha de cabidela

Já que o bicho morreu, não se deve desperdiçar nada. Aí está: buchada.
Carneiro ensopado

5 kg de carneiro
300 g de toucinho defumado cortado em cubos
1 xícara de óleo
1 cebola média picada
1 pimentão médio picado
4 galhos de hortelã picados
6 folhas de manjericão
1 tomate grande picado
6 dentes de alho socado
1 colher (sopa) de colorau ? urucum
1 pitada de orégano
5 folhas de louro
4 galhos de salsa
½ xícara de vinagre de vinho tinto
Sal a gosto

Corte o carneiro em pedaços, lave com limão, coloque numa panela aberta com água que cubra. Leve ao fogo e deixe até ferver. Passe para um escorredor, lave em água fria e deixe escorrer bem.
Na mesma panela, coloque o toucinho e o óleo e deixe dourar. Junte o carneiro aferventado e refogue com todos os ingredientes restantes. Cubra com água quente e cozinhe por cerca de 30 minutos ou até a carne ficar macia.



Galinhada do Bahia

½ xícara de óleo
4 dentes de alho socados
1 cebola média picada
1 tomate picado
4 colheres (sopa) de vinagre
1 pimentão médio
5 folhas de manjericão
5 folhas de hortelã
4 folhas de louro
1 colher (sopa) de colorau
½ colher (sopa) de cominho
1 pitada de orégano
3 galhos de salsa
Sal a gosto
1 galinha caipira de 2,5 kg, picada, lavada em água fervente e escorrida

Coloque o óleo numa panela e deixe aquecer. Junte todos os temperos e refogue por 3 minutos. Junte, então, os pedaços de galinha e refogue por 2 minutos. Adicione 2 xícaras de água quente e deixe cozinhar por 30 minutos ou até os pés ficarem bem macios.

Galinha de cabidela (ou galinha ao molho pardo)

Recolha o sangue de uma galinha caipira e coloque no liquidificador com ½ xícara de vinagre, suco de meio limão, 5 folhas de hortelã e 1 tomate. Bata tudo e despeje na panela com a galinha feita do mesmo modo que a galinhada. Deixe ferver por 5 minutos e pronto.

Nota: segundo ele, neste caso deve-se comprar a galinha viva para abater em casa, já que não há sangue para vender.

Serviço
Galinhada do Bahia
R. Zurita, 46 - casa 08 - Canindé- SP
Tel. (11) 3315-8614
www.galinhadadobahia.com.br




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