Jaracatiá é o que é
Comida Saudável

Jaracatiá é o que é


Com dois, três dias depois de colhidos, eles começam a manchar um pouco, mas a pele costuma ter uma coloração uniforme, é fininha e comestível.
O dono do jaracatiazeiro: Seu Osni, farturense e entusiasta
A árvore pode chegar a 7 metros e, diferente do mamão, é ramificada. Linda, linda.

O fruto pode ser comido assim, in natura. Mas, o ideal é riscar ou cortar e lavar para sair o excesso desta seiva leitosa, que pode ser irritante. Casca e sementes são comestíveis.
Conforme prometi no post anterior, aqui está a resposta da charada: jaracatiá. Pois é, como se vêem nos comentários, só a Mariana acertou. Não vi o programa sobre o Slow Food que passou ontem no GNT, e não sabia que a Evanilda ia falar de jaracatiá - líder do Convivium de Piracicaba, ela está fazendo seu trabalho de mestrado na Esalq sobre a fruta. Coincidência boa.
Neste feriado de carnaval, lá em Fartura, meu pai veio todo feliz dizendo que havia descoberto um pé de jaracatiá carregado no sítio do vizinho Osni. As sementes foram levadas do sítio do meu pai quando ele nem era ainda o proprietário. Todos os pés dali foram arrancados pelo vento - é uma árvore mole, e não houve reposição. Agora, com as sementes do Seu Osni, vamos plantá-lo novamente.
Já falei um pouco de jaracatiá na aldeia dos Guarani, que o comem assado (vejam AQUI); do jaracatiá da cidade de São Pedro que comi em Piracicaba (vejam AQUI). E dei uma receita de compota AQUI.
Planta originária do Brasil, o jaracatiá, mamãozinho ou, mamão bravo é batizado como Jaracatia spinosa, embora a árvore que encontrei não apresentasse espinhos. Pimentel Gomes, no livro Fruticultura Brasileira registra como Jaracatia dodecaphylla DC; e tem também o Carica quercifolia A. St.Hil. que virou Carica Vasconcella quercifolia. Talvez possa ser chamado apenas de Jaracatia sp. já que há muitas espécies silvestres e eu não sei qual é qual. Pode ser encontrado em diversas formações florestais, de norte a sul, mas hoje é considerado um fruto em extinção. E o fruto raramente é visto no mercado (é símbolo da cidade de São Pedro, no estado de São Paulo, perto de Piracicaba, e durante a temporada, no começo do ano, pode ser comprado na feira). Seu talo mole também rende doce, ralado como cocada - descobri que não precisa cortar a árvore, basta cortar um dos talos e usar o interior. Daí o nome, do tupi, iaracatiá que quer dizer fruta da arvore de talo mole (também sem certeza). Aliás, numa oficina de culinária guarani que tive oportunidade de participar fiquei sabendo que costumam consumir o fruto assado. E é assim que meu pai também come. Segundo ele, basta cortar, encostar a polpa aberta no açúcar e grelhar na brasa. O meu, na foto do post anterior, fiz na frigideira e ficou muito bom.
Um alerta que sempre se faz em relação à frutinha é sobre a seiva leitosa - purgativa e vermífuga - presente principalmente quando verde, mas também madura. Como o mamão. Trata-se de papaína e, sendo assim, basta riscar a superfície do fruto horas antes de consumir ou cortar e deixar um pouco na água. O fruto muito maduro tem menos deste efeito e se cozinhá-lo desaparece. Isto se tiver apenas papaína. Não sei a composição desta seiva. Se alguém souber, contribuições são bem-vindas. De qualquer forma, a papaína, que é uma enzima proteolícia (ou seja, digere proteínas) é inativada pelo calor. Por isto a gelatina de mamão ou de abacaxi só funciona com o fruto cozido. E a vitamina de leite com mamão endurece e amarga se deixarmos parada por um tempo. Mas a papaína do mamão, assim como a bromelina do abacaxi só vão causar algum mal à sua mucosa ou à sua mão se você estiver com alguma lesão aberta. Se não, o efeito é quase nulo. Por que abacaxi dá afta e mamão, não? Ambos têm enzimas proteolíticas, mas o abacaxi é ácido e agride mais a mucosa, deixando-a mais exposta para a ação da bromelina. O mamão não é ácido. Já o jaracatiá tem uma ligeira e desejável acidez que pode causar um pinicamento muito leve. Pelo menos foi isto que aconteceu quando eu comi o fruto in natura. É só não comer muito. Eu comi uns três, quatro, neste estado, porque não resisti. Mas não tive nenhum incômodo intestinal nem aftas. Apenas um leve pinicar na boca, bem leve mesmo. Só não comi mais por medo. Meu pai também come in natura e nunca teve nada. Tampouco queimei a mão ao manusear os frutos sem luva (apesar do apelo do Seu Osni). Imagino que o homem do campo tenha sempre um machucadinho na mão e um pinguinho daquela seiva deva queimar como fogo, corroendo a carne - proteína exposta. Fora tudo isto, como é uma espécie silvestre, pode haver variedades mais bravas e mais mansas (o fruto dos guarani, de Bertioga, eram um pouco diferentes no formato destes de Fartura, por exemplo). Quem tiver informação sobre isto, então, por favor, me mande, porque não encontrei nada.
Esquecendo os inconvenientes, vamos de novo ao fruto. Nunca o tinha provado fresco e cru e fiquei maravilhada. Outro mito que se desfez é em relação às sementes. Sempre mandam tirar para fazer compotas e achei que fossem como as do mamão. Mas, para comer in natura ou assar, elas podem ser mantidas e dão ao fruto uma mistura de texturas interessantíssima. A polpa bem alaranjada é cremosa, bem doce, enquanto as sementes (muitas e não poucas, como disse no outro post) são crocantes quase como as de maracujá, doces e cobertas por uma gominha viscosa como a do quiabo. Tudo isto na boca forma uma geléia texturizada de sabor maravilhoso que lembra uma combinação de frutos tropicais - goiaba, feijoa, araçá, maracujá. É muito perfumado e com sabor marcante, bem diferente do fruto na compota ou no sorvete, que perde grande parte destas características.
Trouxe um tanto de Fartura, experimentei congelar (dá certo, para depois usar em bolos ou compotas, mas perdeu um pouco o sabor e o perfume), fazer um bolo (errei a massa, que precisaria ser um pouco mais firme) e o sorvete. Este até que ficou bom, mas o sabor marcante e os aromas se perderam depois que cozinhei, mesmo sendo com vapor, sem banhá-las em água. E o fruto in natura tem a tal da seiva que reagiria com a proteína do leite, coagulando e amargando a mistura.
O fato é que o fruto tem um potencial gastronômico enorme - a compota, mesmo que mais suave, é um delícia, e deveria estar nas feiras e nos restaurantes. Meu pai deve trazer mais na próxima semana e aí sim pretendo testar crumble, outros sorvetes, bolos, tortas, geléias. E, como criança que engole chiclete com culpa, devorar algumas cruas, com seiva, semente e tudo, por minha conta e risco, fique claro.

Sorvete de Jaracatiá
5 jaracatiás bem maduros, mas firmes (330 g)
300 ml de leite
100 g de açúcar
120 ml de creme de leite
Corte as frutas ao meio, sem descascar, e deixe de molho em água fria por meia hora para extrair o excesso de seiva. Escorra bem. Tire, com uma colherinha, as sementes (deve render 230 g de polpa limpa) e leve a polpa para cozinhar no vapor por cerca de 10 minutos ou até ficar macia. Deixe esfriar e resfrie na geladeira. Bata bem todos os ingredientes no liquidificador, deixe gelar um pouco e coloque na sorveteira. Deixe até ficar cremoso. Leve ao freezer ou congelador por cerca de 1 hora ou até ficar mais firme. Se não tiver sorveteira, leve a mistura ao freezer ou congelador e deixe congelar - de vez em quando misture mistura com uma colher para ficar cremoso.
Rende: 6 porções
Nota: se quiser, pode tirar a pele do jaracatiá, mas ela é fininha e comestível.


Estas viraram o bolo, mas a experiência não deu muito certo. De qualquer forma, poderiam ser simplesmente assados assim, com açúcar e casquinha de limão. Ou com uma farofinha crocante por cima.




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