Vermelhos temperos
Comida Saudável

Vermelhos temperos



Ontem, limpando armários e geladeira, fui fazendo grupinhos de afinidades com os temperos que se vão acumulando por aqui. Só então me dei conta da quantidade enorme de ingredientes vermelhos que usamos para dar cor, sabor, picância e beleza. E olhe que nem havia pastas de tomate.

A maioria destes corantes é derivado de pimentas e seus licopenos - os mesmos do tomate. E aí temos pápricas húngaras em pasta ou em pó, pápricas espanholas defumadas - pimentón de minha perdição, pimentas em conserva, pimentas malaguetas secas ou piri-pri, flocos de pimenta coreana para kimchi, e até a jiquitaia dos índios Baniwa. Mas também temos outros pigmentos rubros, como a bixina no urucum, o óxido de ferro no sal do Havaí, e até inocentes cochonilhas que fazem o carmim usado no tandoori massala para reforçar a cor de brasa viva (às vezes são substituídas pelo corante artificial).
O que não pode é deixar pálida aquele carne de frango sem pena, sem pele nem tostados. Tente jogar por cima de um simples macarrãozinho cabelo de anjo cozido no leite uma colherada de manteiga derretida com pimentón de La Vera (ou que seja uma páprica qualquer). Ou grelhar o magro filé de frango num fio de azeite de urucum. Quem sabe, umas meras gotinhas de molho de pimenta vermelha sobre uma sopa cremosa amarelo-bebê. Ou umas rodelas de pimenta numa triste salada de nabo. Vermelho nem precisa cheirar ou ter sabor, basta atiçar a bocada, como a capa vermelha e o touro.

Merquén o Merkén: aji seco do povo mapuche, do Chile (pimenta seca e defumada, triturada na pedra junto com outras especiarias como sementes de coentro, sal, pinoles etc - um tipo de curry mapuche. Dá pra imaginar a gostosura disto? É uma das Fortalezas do Slow Food, no Chile (lindas fotos feitas por quem me deu de presente, Anna Paula Diniz, da DoDesign-s, aqui).

Pai pimenteiro: não é porque sou coruja, mas esta dedo-de-moça seca no fumeiro e triturada, feita pelo Seu Toninho é uma iguaria que só se faz para filhos (viche, minhas irmãs não ganharam - mas também, não leem meu blog).

Kimchee Hot Pepper: o pacote é enorme, quase meio quilo, mas aqui acaba logo. É uma pimenta em flocos delicados e ligeiramente defumada, indicada para o preparo da conserva de acelga coreana, o Kimchi. Compro sempre na Casa Bueno, na Liberdade e uso em qualquer prato que peça um pouco de picância. Ou muita, por que não? (ela está aqui neste prato de espaguete de pupunha)

E tem o sal: à esquerda, a jiquitaia baniwa, feita com pimentas secas ao sol e socadas com sal. Veja sobre ela, aqui. O outro é o sal do Havaí - a coloração avermelhada se dá pela presença do óxido de ferro.



Pápricas húngaras: presente do meu amigo Pedro Henrique. As de cima são em pó - o saquinho branco feito com pimentas doces e o vermelho, ardidas, muito ardidas. Embaixo, páprica em pasta, para homem muito matcho, e a fraca, pra mulherzinha. A mistura das duas é o ideal.




Pimentón de La Vera: são minhas pápricas preferidas (já falei delas aqui). Defumadas, delicadas, deliciosas e viciantes. Agora já há delas pra vender no Santa Luzia (um ótimo presente de Natal - pelo menos eu gostaria de ganhar e está com ótimo preço - minha amiga Noemi Marinho acaba de me dizer que pagou menos de 6 reais a latinha).


Goji berries: por aqui a moda parece que ainda não pegou, mas na Europa e Estados Unidos virou febre por causa de suas propriedades antioxidantes. É daqueles alimentos que se transformam em panaceia da noite pro dia, que prolongam a vida e, dizem por aí, pode curar até câncer. Da mesma família das pimentas e dos tomates, são ricas em licopeno e em vários outros carotenóides e isto é bom. Mas vamos com calma. Ninguém precisa sair em desespero até o mercado chinês mais próximo para comprar estas berries do Hymalaia chinês (se bem que já devem estar plantando por aí, afinal é uma Solanácea que deve se adaptar bem por aqui). Ela não vai ser a cura para todos nossos males. Mesmo porque vivemos há tanto tempo sem elas. E temos o açaí! Agora, se for fácil de encontrá-la, saiba que a vantagem é que são ricas também em açúcares e podem ser comidas como passas. No começo é estranho, mas depois vicia. Podem ainda ser hidratadas e adicionadas em saladas, sobre o tofu, em sopas, no arroz, no que quiser.
Conheci primeiro com a Maria Helena Guimarães, que me trouxe o saquinho (foto de cima) dos Estados Unidos (ou comprou no Japão?) e depois passei a comprar no bairro da Liberdade, nas lojinhas chinesas, onde não há muita preocupação em te explicar o que é nem deixar isto claro na tradução do rótulo para o português. No meu saquinho lê-se, em vez de Goji ou uma berry qualquer, simplesmente "semente vermelha desidratada". A não ser que entenda os ideogramas chineses, a única informação inteligível é "Dried Licium barbarum L.". É a coisa!

Direto da Índia - presentes do Luiz Paulo Stokler Portugal, a quem passo a palavra: O tandoori masala originalmente leva o corante de cochonilha (do cacto) que é carmim (vermelho puxando para o espectro violeta) e mais um bocado de cúrcuma (amarelo puxando para espectro laranja) para corrigir o tom. No caso desse popular que chega no varejo, a cochonilha é sintética (idêntica ao natural) e o amarelo vem da vilipendiada tartrazina mesmo como pude conferir na embalagem. E mais: O carmim não deixa gosto em nada, tanto o natural quanto o sintético. Consultando as normas do FDA e da CE vejo que possuem as mesmas advertências um bocadinho paranoicas sobre alergias (que ocorrem também com a cochonilha natural e a cúrcuma). A intenção final é ter um frango cor de brasa assim que retirado do forno. Normalmente o tandoori masala é usado na marinada com iogurte. Depois descarta-se a marinada e assa-se o frango (normalmente sem pele e em pedaços) em forno bem alto. O carmim não aguenta cozimento prolongado sem se degradar ou se diluir no meio, portanto não serve para um curry ordinario se o assunto é cor. Muitos produtos chineses que tenho aqui também abusam da cochonilha sintética e parece que a produção do afídio não vence a fome da estética alimentar de 2,5 bilhões de consumidores combinados da Ásia. LPSP O saquinho da direita é uma pimenta em pó indiana, super picante.

Urucum: o pigmento vermelho que tinge o arilo destas sementes, composto principalmente de bixina, pode ser extraído com fubá para fazer colorau, ou em azeite aquecido para fazer o óleo de urucum. No México o urucum vira achiote, que é este da caixinha, um tablete de urucum misturado com condimentos, sal e vinagre, pronto para ser diluído em suco de laranja ou vinagre e temperar carnes - presente da Maria Eugênia. O urucum é um dos principais corantes na indústria alimentícia, presente em queijos, margarinas, embutidos, sorvetes e até em licores. O óleo e o pó foram feitos por mim (veja aqui).

Malaguetinhas secas: piri-piri, do Mercado de Lisboa. E baby chilli pepper da Ilha de Malta (presente do amigo Pedro Henrique) - tem também um ligeiro defumado, mas arde só de cheirar.


E, o que não pode faltar: pimentas em conserva e molho (já mostrei como estas foram feitas: molho e conserva)




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