Cará-do-ar, cará-moela ou inhame-do-ar, inhame-moela?
Comida Saudável

Cará-do-ar, cará-moela ou inhame-do-ar, inhame-moela?



Em dois ou três meses já pude comer estes bulbos que nasceram na minha cerca.

Como canta nosso Tom Zé, ?tô te confundindo, pra te esclarecer?. Já falei aqui sobre a confusão de nomes de carás e inhames. Mas acho que agora finalmente a padronização é para valer. Pelo menos todos os artigos científicos que tenho lido sobre isto já registram o nome Taro para o Colocássia esculenta, o ex-inhame, aquele redondo, marrom com toques arroxeados, de folhas como as da taioba, de polpa cremosa e lisa, e Inhame para o Dioscorea spp (D. alata, D. bulbifera, D. cayenensis, D. dodecaneura, D. dumetorum e D. rotundata), aquele que em São Paulo conhecemos como cará - grande, marrom, com polpa branca ou roxa, úmida, viscosa e algo granulosa e outras espécies como este da foto. A padronização da nomenclatura foi decidida na Assembléia Geral do I Simpósio Nacional sobre as Culturas do Inhame e do Cará, realizado em Venda Nova do Imigrante, em abril de.2001, atendendo ao que prevê o Código Internacional de Nomenclatura Botânica. De modo que agora cientistas, órgãos do governo e quem quer dar nome certo às coisas, devem atender à determinação. Vejam aí:


?Assim sendo, ficou estabelecido que os órgãos governamentais, universidades, empresas de pesquisas e de extensão rural, Sociedade de Olericultura do Brasil e demais entidades ligadas ao setor agrícola, oficializem e divulguem, no âmbito técnico-científico nacional, a nova nomenclatura, onde "inhame" (Colocasia esculenta) passa a ter a denominação definitiva de "taro" e as Dioscoreáceas (Dioscorea spp.), chamadas popularmente no norte/nordeste brasileiro de "carás" e "inhames", passam a ter a denominação definitiva de "inhame". As espécies de "carás" cultivadas, serão consideradas como variedades de inhame?.

Marney Cereda e outros. Uso de nomes populares para as espécies de Araceae e Dioscoreaceae no Brasil. Hortic. Bras. vol.20, no.4, Brasília, Dec.2002.
Artigo completo aqui.


Carás-do-ar (inhames) do sítio em Fartura-SP e do meu quintal (o arroxeado).


Talvez agora isto gere mais confusão ainda, mas daqui a algum tempo não vamos mais ler textos traduzidos do inglês que falam dos super poderes do inhame quando na verdade estavam se referindo ao cará, yam. De agora em diante o cará vira oficialmente inhame, como sempre deveria ter sido e todo mundo entenderá que inhame ou yam é do gênero Dioscorea e não Colocasia. Claro, que deve ser sempre acompanhado do nome científico. E quando alguém disser para comer inhame porque é bom pra menopausa, estará mesmo falando do inhame Dioscorea.

Falar em menopausa, um detalhe sobre a pílula: algumas espécies silvestres de cará (agora inhame) contêm substâncias tóxicas, mas essas mesmas substâncias tornaram-se úteis ao homem quando, por volta de 1940, descobriram-se que as saponinas esteróides destes bulbos podiam ser usadas na fabricação da cortisona e de hormônios sexuais. Em 1956 o uso farmacológico da Dioscorea ganhou mais notoriedade quando foi anunciado que o esteróide diosgenina tinha a capacidade de impedir a concepção. Até aquele momento os esteróides preventivos da concepção tinham que ser tomados por injeção. Com a nova descoberta passou a ser possível a administração oral. Nasceu, assim, a pílula - que hoje é quase que inteiramente sintética. Recentemente novas pesquisas vêm testando os componentes estrogênicos do cará (agora inhame) na terapia de reposição hormonal, mas não há evidências de que se possam obter os mesmos efeitos comendo o cará, pois esses compostos são extraídos dos carás silvestres e mesmo assim teriam que ser comidos às toneladas.

Se não há comprovação de que comer cará possa substituir os hormônios sintéticos, ao menos sabe-se que é bom comê-lo porque é saboroso e nutritivo. É ainda um ingrediente versátil na cozinha além de se conservar fresco por vários dias. Ele pode ter os mesmos empregos que a batatas - rocamboles salgados, sopas, pães, purês, suflês e pratos doces como pudins e bolos.

Agora já não sei mais como chamar nosso cará-do-ar (Dioscorea bulbifera). Será inhame-do-ar, inhame-moela? Bem, seu caráter sei que não muda. Ele produz bulbos aeréos arredondados ou em forma de fígado ou moela. O aspecto lembra algo assim. Na África, essa espécie pode alcançar até 2 kg. Diferente do outro, o Dioscorea alata, mais comum, que dá o tubérculo embaixo da terra e é a espécie mais difundida no Brasil, o cará-do-ar tem textura menos granulosa e um ligeiro amargo característico muito bom. De resto, é mais cremoso depois de cozido, menos viscoso e a polpa pode ser esverdeada ou arroxeada. Ah, e pode ser plantado em qualquer pedacinho de terra desde que lhe dê uma cerca pra trepar.

Hoje o Brasil é produtor e consumidor principalmente de batatas e mandiocas (esta, mais na forma dos subprodutos). Mas carás e inhames ou inhames e taros já tiveram sua importância na culinária regional e sei que no Vale do Paraíba e do Ribeira ele é usado em pratos com carne de porco e outros à moda das batatas.


Vamos ao que fiz com ele:




Cará-do-ar (inhame-do-ar) e mangarito no vapor com especiarias na manteiga

300 g de cará-do-ar (inhame) branco e roxo e mangaritos (na proporção que quiser)
2 colheres (sopa) de manteiga
2 dentes de alho bem picados
1 pimenta dedo-de-moça sem sementes picada
1 colher (chá) de sal
1 colher (chá) de grãos de coentro ligeiramente socados
1 colher (chá) de cominho
2 colheres (chá) de cúrcuma fresca ralada
Folhas de alfavaca a gosto

Corte em dois cada cará sem descascar e leve para cozinhar na parte de cima da cuscuzeira ou panela de vapor com água na parte de baixo. Deixe no fogo, com a panela tampada, por cerca de 10 minutos ou até ficar macio, mas ainda firme. Coloque o mangarito com casca, bem lavado, sobre o cará e deixe cozinhar por cerca de 3 minutos ou até ficar macio. Espere amornar, descasque o cará e corte em pedaços do tamanhos dos mangaritos - estes devem ser descascados puxando a pele com os dedos, que sai muito facilmente. Numa frigideira antiaderente aqueça a manteiga e junte o coentro e o cominho. Espere começar a pipocar. Junte, então, o alho e refogue até começar a dourar. Coloque a pimenta picada e mexa por meio minuto. Acrescente o inhame e o mangarito, tempere com o sal e chacoalhe a frigideira para envolver tudo com o tempero. No final, junte as folhinhas de alfavaca, misture e sirva.
Rende: 4 porções




Carne com cará-do-ar (inhame)
1 colher (sopa) de óleo
2 dentes de alho
500 g de coxão duro
1 colher (chá) de sal ou a gosto
2 folhas de louro
2 tomates sem pele picados
2 xícaras de água fervente
1 cebola picada
½ pimentão verde picado
1 pitada de pimenta-do-reino
4 carás-do-ar (inhame) descacados e picados
2 colheres (sopa) de salsinha

Numa panela de pressão aqueça o óleo e junte o alho socado. Quando ameaçar a dourar, junte a carne com o sal e vá mexendo até começar a fritar. Junte as folhas de louro e o tomate e mexa delicadamente. Despeje por cima a água fervente, tampe e deixe cozinhar em fogo baixo por cerca de meia hora, marcada a partir do momento em que a válvula começou a chiar. Desligue o fogo, espere acabar a pressão e abra. Confira se a carne está macia. Se não, cozinhe por mais um pouco. Junte a cebola, o pimentão, a pimenta-do-reino e o cará (inhame). Deixe cozinhar por cerca de 15 minutos ou até o cará ficar bem macio, mas não mole. Confira o sal e corrija, se necessário. Reitere a pimenta se quiser. E polvilhe com salsinha picada.
Rende: 4 porções


Basta enterrar um bulbo que logo ele brota. Este brotou mesmo fora da terra. Plantado, rendeu as batatinhas vistas na primeira foto.


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