Ora-pro-nóbis
Comida Saudável

Ora-pro-nóbis




Basta uma temporada de chuva para o meu pé de ora-pro-nóbis ficar exuberante e, se deixar, indomável. Mas alguém tem que ter bom senso nesta casa. Felizmente o Marcos tem. Do contrário, sem podas periódicas, meu sobradinho pequeno já estaria sufocado por galhos trepadores e espinhos maus. Eu tenho dó de podar. Neste fim de semana Marcos meteu a tesoura e recolheu as folhas. E haja folhas. Fiz uma salada com o ingredientes que tinha na geladeira e no quintal, mas poderia ter cozido as folhas com frango, feito uma quiche, uma sopa, uma pizza e tantas outras coisas.

Não parece, mas esta planta, Pereskia aculeata, é um cacto e dos bem espinhentos. Nativo da América tropical, pertence ao gênero das Pereskias, o mais primitivo dos cactos, único com folhas desenvolvidas. E é aí que a gente entra. Estas folhas brilhantes, gorduchinhas, crocantes, verde-escuras e nutritivas são também deliciosas. Diferente dos cactos modernos, com caules grossos e altamente suculentos, ele é mais fino e fibroso, com grandes espinhos na base das folhas, ou melhor, falsos espinhos chamados de acúleos, daí seu nome P. aculeata, para diferenciar das Pereskias sem acúleos. Mas já aviso que pinica e machuca igualzinho a um espinho verdadeiro e dos bem afiados. Em Tiradentes, Sabará e cidades mineiras vizinhas é comum encontrar as folhinhas em pratos com carne de porco ou frango. Mas já perguntei pra muita gente em Gonçalves, que fica no Sul de Minas, e ninguém a conhece. No Nordeste também é comum, mas nesta região perde as folhas periodicamente e produz mais flores (apreciadas pelas abelhas) e frutos, ambos comestíveis.

Hoje ele está presente em muitos países, quer como planta ornamental, por seus frutos comestíveis (barbados gooseberry
) ou por suas flores melíferas - Israel a cultiva com este fim.

Esta era a do sítio - embaixo dela havia uma pitangueira
Já plantei no sítio e tive que acabar com a ladainha porque, como passamos algum tempo sem ir lá, um dia chegamos e a planta tinha encoberto uma palmeira grande, sufocado um pé de pitanga e esganado vários pés de café. E quem chegava perto com aquele tanto de espinho? Tivemos que cortar na base e esperar secar para depois puxar os galhos.

Por isto, apesar de todo mundo por aqui louvar suas virtudes, e eu faço coro, em lugares como Austrália e África do Sul ela é considerada uma planta exótica invasora, danosa para o meio ambiente e que deve ser ferozmente combatida. Se, por um lado, é ótimo que ela seja vigorosa, perene, que nos dá alimento o ano todo, por outro, forma touceiras intransponíveis, que vão se alastrando e sufocando a flora nativa. Em compensação, aqui no seu habitat, é útil para cerca viva, para as abelhas e como alimento. É só não perder o controle. Basta dizer novamente que a tenho plantada aqui num quintal minúsculo.

Está certo que se costuma exagerar em suas virtudes nutricionais em relação às proteínas, a ponto de ser chamada carne dos pobres. Na verdade, as folhas frescas têm teores parecidos com outras folhas que costumamos comer, como o espinafre, um pouco mais talvez. O fato é que as folhas podem ser desidratadas, concentrando as proteínas e outros nutrientes e esta farinha poderia ser usada para aumentar o valor nutricional de pão, macarrão e alimentos infantis. O mesmo aconteceria com outras folhas, com a diferença de que ela é uma planta rústica e produz folhas com fartura. O que não pode é comparar a proteína de 100 g de pó (imaginem quanto de folha fresca é necessário para obter esta quantidade!) com 100 g de carne fresca ou 100 g de espinafre fresco. E muitos trabalhos fazem isto. Aí é covardia com o comparado. De qualquer forma, embora não substituam a carne, as folhas frescas são muito saudáveis (têm mucilagens, betacaroteno, folacina, cálcio, fósforo e ferro) e combinam com tudo nos pratos salgados. Não é amarga ou ardida, nem tem sabor forte. Qualquer criança come sem reclamar.
Para usar, coloque-as inteiras ou picadas diretamente sobre um caldo já quente e espere que amoleçam. Ou ainda, refogue-as rapidamente em azeite ou óleo com alho e cebola, antes de juntar ao prato que está preparando. As folhinhas mais novas podem ser usadas para enrolar pedaços de queijo ou kani temperados com azeite e sal e presas com palito. Viram um tira-gosto de festa. Como substituto do espinafre, faz suflês, bolos salgados, panquecas, recheio de lasanhas ou entra em massas de macarrão e pão, dando coloração esverdeada.
Quem quiser uma muda, que venha buscar, pois na feira você não vai achar.

Para a salada de ora-pro-nobis, usei:
Folhas de ora-pro-nobis
Folhas de azedinha
Folhas de jambu (a florzinha amarela que faz a língua tremelicar)
Tomate
Cebola roxa temperada com um pouco de açúcar
Bolinhas de mussarela de búfala (podia ficar sem)
Temperei com vinagrete de limão rosa com alfavaca picada e pimenta-do-reino.




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