Artigo traduzido por Hilton Sousa. O original está aqui.
por Ashley Rekem
Seria possível que uma combinação de fatores sinistros está em ação guiando a epidemia de obesidade americana ?
Recentemente, eu tive acesso a um artigo aqui no Bangor Daily News escrito por Jackie Conn. Nele, referindo-se à obesidade na América, ela escreveu:
É o problema do indivíduo e eu estou pronta para ouvir a ladainha sobre porquê torna-se então um problema da América. Eu já ouvi isso mais vezes do que preciso! A coisa importante aqui é que a América já tem o suficiente de problemas sem solução. Por que deveríamos colocar mais esse nas costas do país, quando não é algo que a "América" pode corrigir ?
De acordo com o CDC (N.T.: Centro de Controle de Doenças), só nos últimos 30 anos a quantidade de adultos e crianças obesas dobrou, a de adolescentes quadruplicou, e juntamente com isso a tendência ao diabetes tipo 2 aumentou nove vezes.
Apesar de eu não achar que devemos focar na obesidade como um problema isolado que precisa ser "consertado", eu não aceito a noção de que a obesidade é simplesmente problema do indivíduo. Os números acima são gritantes, e não podem ser explicados simplesmente colocando a responsabilidade nas pessoas isoladamente.
Você não é o que você come, e sim o que o seu corpo faz com o que você come. A política nutricional americana não aborda a saúde a partir desse ponto de vista, e isso é uma falha enorme.
Pesar mais do que deveríamos não se resume a comer calorias em excesso e não queimá-las. O corpo é mais complicado que isso. A composição da comida que comemos faz a diferença.
Muitos de nós comem a dieta americana padrão, cheia de comida processada, e ainda assim nem todos entre nós são obesos ou sequer acima do peso. Quão sensíveis somos à insulina, especificamente o quão sensível nosso tecido adiposo e muscular são sensíveis à insulina, é que ditam quão facilmente (ou não) nós armazenamos gordura neles.
E o que causa a secreção de insulina, e para muitos de nós, insulina em excesso ? Açúcar e comidas que são digeridas rapidamente em açúcar – carboidratos processados.
Algumas pessoas podem permanecer magras comendo comidas processadas, e algumas podem perder peso enquanto comem uma porção substancial de carboidratos diariamente, enquanto cortam as calorias. para mim isso foi muito difícil, assim como tenho certeza de que é difícil para milhões de outros americanos. Resume-se ao que eu chamo de "balança genética". Nossos genes têm um papel enorme sobre o nosso peso e sensibilidade à insulina.
E sobre o argumento de que nossos estilos de vida sedentário são grandes contribuintes para a obesidade ? Como eu disse antes, da primeira vez que decidi perder peso, ainda comia massas, pães e similares, tentando ficar nas 1500 calorias diárias – seguindo o aconselhamento convencional. Não funcionava bem para mim, mesmo me exercitando. Eu não conseguia perder quilos sem muita luta, porque armazeno gordura muito facilmente.
Exercício é importante para a saúde e bem estar, mas eu não acho que a crítica ao sedentarismo carrega muito mérito no que diz respeito ao peso da nação, como alguns podem pensar. A composição da dieta é muito mais importante.
Parar a obesidade começa por ignorar as diretrizes dietéticas convencionais.
O USDA (N.T.: Departamento de Agricultura americano) recomenda uma dieta pobre em gorduras e rica em carboidratos. Essa ideologia de limitar a gordura e aumentar os carbos começou por conta de um estudo famoso e cheio de falhas, feito nos anos 1950 – a hipótese lipídica. O estudo foi baseado em ciência fraca, e vilanizou as gorduras dietéticas como causa da doença cardíaca.
No interesse do agronegócio, nosso governo mais tarde projetou uma pirâmide alimentar que tinha essa aparência:
A pirâmide original do USDA, 1992
Não importa que a hipótese lipídica tenha sido provada falsa por muitos estudos mundo afora. Esse experimento furado disparou uma reação explosiva quando partiu para reduzir a doença cardíaca. Pela influência do governo federal, as pessoas começaram a comer muito mais das suas calorias diárias sob forma de carboidratos e as comportas abriram-se para os produtores de alimentos processados venderem seus produtos.
Mais de 20 anos depois, as diretrizes do USDA ainda dobram-se ao agronegócio com o ChooseMyPlate, que é "mais fácil de compreender", mas que tem basicamente as mesmas recomendações dietéticas: ainda empurra os grãos em grandes quantidades, e insiste que grãos processados como cereais, pão e macarrão contam como grãos integrais.
Tome os cereais matinais como exemplo, comidas com as quais crianças e adultos por todo o país iniciam o dia. Fruit Loops, Shredded Wheat, e inúmeros outros produtos vendidos nas prateleiras são comercializados como sendo feitos de grãos integrais. Da última vez que verifiquei, coisas quebradas e moídos não eram integrais. Mais digno ainda de preocupação, é a política do "saudável para o coração".
E em geral, leite (mais provavelmente desnatado ou semi-desnatado) é colocado no cereal. É um commodity também empurrado pelo USDA, e contém 13g de açúcar por copo.
O que ganhamos de tudo isso ? Não apenas mais pessoas sobrepesadas, mas pessoas fisicamente maiores, uma número alarmante de diabéticos tipo 2 e ainda mais doença cardíaca.
Agora a questão é: nós conseguimos, em um sentido financeiro, ignorar as diretrizes ?
Não. A política alimentar nesse país torna as calorias insalubres baratas, e as calorias saudáveis caras. Nós gastamos bilhões de dólares a cada ano em subsídios à agricultura, direcionados a grandes fazendas comerciais que produzem milho, trigo, soja e beterrabas açucareiras usadas para produzir comida-lixo em massa – resultando em excessos produtivos, o que leva a preços deprimidos.
A superabundância de colheitas feitas aqui não deprime apenas os preços nos EUA, mas globalmente – contribuindo para a obesidade entre os pobres de outros países.
Milhões de americanos vivem na pobreza, mal sendo capazes de sobreviver com vales-refeição governamentais. O salário mínimo é tão minúsculo que as pessoas são incapazes de saírem da pobreza ainda que trabalhem tempo integral, o que dirá adquirirem alimentos saudáveis como vegetais frescos.
É difícil imaginar a pobreza, fome e obesidade crescendo juntas, mas elas o fazem. Pobreza é um dos maiores contribuintes para a obesidade nesse país. Uma abundância de carboidratos processados e comidas açucaradas são baratas. Uma renda muito baixa frequentemente faz com que as pessoas vivam próximas a lojas de conveniência que vendem toneladas de comidas processadas e praticamente nada mais, sem um mercado decente por milhas.
E não bastando tantas pessoas vivendo na pobreza com sobrepeso ou obesidade devido às comidas processadas serem o que há de disponível para si, elas também são desnutridas. Ser pesado não quer dizer estar bem-alimentado.
O Congresso sabe que não precisamos de subsídios para a agricultura para prosperar, e há exemplos disso no mundo real. A Nova Zelândia cortou os subsídios pela raiz nos anos 1980 e agora as práticas agriculturais lá são ditadas pelos consumidores – e não pelos esforços em maximizar o recebimento de subsídios às custas dos dólares dos contribuintes.
Pessoas de baixa renda também têm pior acesso a oportunidades educacionais. Sim, os indivíduos podem tomar a perda de peso em suas mãos, e é claro ninguém pode ser forçado a perder peso como Conn afirma em seu artigo, mas sem acesso aos tipos certos de alimentos, sem o know-how e sem os recursos, é excepcionalmente difícil.
Muitos médicos e agentes da área de saúde básica não sabem como aconselhar seus pacientes.
Médicos vão recomendar as diretrizes dietéticas padrão, assim como a Associação Americana de Cardiologia, a Associação Americana do Diabetes e basicamente cada organização de saúde no país faz.
Muitos podem nem fazer isso. Francamente, médicos não têm muito tempo para aconselhar os pacientes apropriadamente, ainda que saibam uma coisa ou outra a respeito de dietas – porque eles só têm cerca de 10 minutos conosco..
Também é muito mais fácil prescrever medicamentos, e é claro as companhias farmacêuticas têm incentivos monterários gigantescos para empurrar esse modo de tratamento.
E o ser humilhado por ser gordo no consultório do doutor ? Foi o que aconteceu comigo mais de uma vez. Eles te dão aquele olhar de "por que ela simplesmente não consegue ter um pouco de auto-controle?". Enquanto alguns médicos são simpáticos ao fato de que muitas pessoas não se dão bem com a dieta americana padrão e que a genética tem um papel no quão grande ficamos, outros simplesmente rotulam pessoas acima do peso como preguiçosas e gulosas.
A saúd emental também não é bem abordada na América. Muitas das vezes, comer por emoção é o culpado pelo ganho de peso. Novamente, muitos vão desdenhar dessas questõs. "Ah, por que você não fala com o Dr. Phil ?" (N.T.: psicólogo americano famoso, com um programa de TV no ar desde 2002). Lidar com eles holisticamente não é padrão de cuidado com saúde nesse país.
Sim, também chega às escolhas e iniciativas individuais – mas não vamos deixar de fora o quão doente é o ambiente americano.
"A melhor dieta do Dr. Oz: Perca 8kg em 14 dias
2 milhões de mulheres não podem estar erradas"
Eu nunca vi um grupo de pessoas tão confusas e divididas sobre o que comer. As prateleiras nas filas dos caixas de supermercados ficam cheias de revistas prometendo soluções para a perda de peso e sabedoria dietética. Nessas revistas estão propagandas para drogas e suplementos que prometem mais soluções para perda de peso, e então você chega em casa, liga a TV e há mais propaganda a desfrutar.
Obesidade é altamente lucrativa. Assim como são as doenças que a acompanham
No passado eu tentei tantas dietas e suplementos ridículos e sempre sofri com o efeito sanfona, cada ciclo me deixando mais pesada do que estava antes. Isso começou quando eu era adolescente. Meu pai colocou um comprimido supressor de apetite na minha mão, e me colocou em uma dieta na qual por 3 dias da semana as calorias eram severamente – idioticamente – restritas. Um almoço nessa dieta era um copo de queijo cottage sem gordura e 5 biscoitos cream-cracker. Loucura.
Honestamente, eu não compreendia aquilo. Não compreendia que as comidas que todos à minha volta me ensinaram a comer eram as que me faziam engordar. Olhando para trás, posso ver o quanto sofri de lavagem cerebral. Eu tinha que estar em algum estado mental alterado para tentar todas aquelas dietas, somente para voltar àquela que me fazia engordar, e então não questionar nada disso.
Até que prestei atenção à bioquímica da nutrição, eu não compreendia que o corpo faz coisas vastamente diferentes com alimentos diferentes. Eu comia alimentos supostamente saudáveis, tais como pão e macarrão integral, e fazia com que meu corpo produzisse insulina em excesso – fazendo assim com que ele produzisse gordura.
Dietas ricas em carboidratos e pobres em gordura não são saciantes. Quando eu reduzi a minha ingestão de carboidratos, a variação constante na minha glicemia foi embora e pela primeira vez, quando fiquei com fome não me senti trêmula e com uma necessidade urgente de comer. Eu superei o meu medo da gordura e garanti que comesse mais dela em minhas refeições, juntamente com grandes quantidades de legumes. Com tais mudanças, eu permanecia cheia por mais tempo. Esse novo modo de me alimentar me ajudou a vencer meu hábito de comer demais. E nada mais de contar calorias também.
Isso me leva a outro ponto. Nós podemos nos culpar por comer demais, e outros podem nos julgar por isso, mas sinto que deveríamos dar mais atenção ao fato de que as comidas que comemos ditam nossas respostas psicológicas a elas. Carboidratos processados e açúcar podem ser viciantes como drogas. Eles causam grandes flutuações na glicemia, nos deixam famintos e fazem com que tenhamos compulsões.
A América tem muitos problemas, e vários deles têm uma coisa em comum: a compra de interesse político.
O dinheiro é a raiz do mal em muitas das nossas políticas atrasadas, produzindo disparidades que geram desigualdade de renda maciça, comida-lixo barata, serviços de saúde caros com desfechos ruins, e educação custosa com resultados ruins. Todos contribuem enormemente para a crise de obesidade enfrentada pela América.
Nosso peso é devido em parte às escolhas que fazemos como indivíduos, e as atitudes para com os sobrepesados e obesos são difíceis de mudar, mas mudanças políticas podem ter impactos enormes quando são feitas no interesse da saúde e bem-estar das pessoas.
Não importa quantas iniciativas de saúde pública sejam disparadas para que se tenha bancas de frutas nas lojas de conveniência em vizinhanças pobres. Enquanto as decisões políticas forem feitas baseadas nos interesses das corporações do agronegócio, planos de saúde e farmacêuticas, nunca vamos avançar na resolução do problema da obesidade.
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