Tucupi amarelinho amarelo tartrazina
Comida Saudável

Tucupi amarelinho amarelo tartrazina






Que tucupi é amarelo todo mundo sabe,  às vezes mais desbotado, às vezes separado em fases, com o pigmento sedimentado. Para quem não sabe como é feito o tucupi, veja este que fiz aqui em casa usando mandioca mansa (aipim, macaxeira) em vez da tradicional   mandioca brava que confere um sabor mais amendoado. Mas, de uma forma ou outra, são amarelos discretos, muito diferente do que se vê atualmente no Mercado Ver-o-Peso em Belém e agora em Rio Branco, no Acre.

Para os desavisados, apenas um produto naturalmente amarelo,  ora como gema, ora como fanta laranja escandaloso. Chega a ser bonito de se ver. Quando o amarelo for uniforme, desconfie. Prefira aqueles mais esbranquiçados na parte de cima.

O primeiro que vi no Mercado Municipal de Rio Branco já desconfiei - tem corante. Do segundo em diante tinha certeza e fui logo perguntando para uma vendedora simpática que não tem a mínima noção de que esta prática seja condenável.  Com a pergunta na lata e sem condenação, "tem corante, né?, qual é o corante?", ela confirmou e, sem que eu pedisse, me mostrou o corante e ainda permitiu que eu fotografasse o rótulo. Nenhuma malícia ou desconfiança das minhas intenções. Só não me sinto mais traidora da confiança de inocentes porque acredito que falta mesmo informação sobre as consequências desta adulteração - que para muita gente trata-se apenas de um reforço poético da imagem do tucupi amarelinho.


Tanto não é visto como adulteração que no próprio comércio onde se vende o tucupi encontra-se também duas marcas de corante, contendo não só amarelo tartrazina e amarelo crepúsculo como também glicose (clique e amplie a foto de baixo), o que pode explicar o sabor meio adocicado do tacacá da dona Maria lá de Belém, considerado um dos melhores. Mas é só suposição já que ela diz que não coloca açúcar e ainda assim o tucupi que ela mesma faz é tão amarelo e docinho.

Coincidentemente saiu neste último final da semana na imprensa (a Patrycia Coelho, lá de Rio Branco) um artigo falando sobre o projeto do senador Jorge Viana (PT-AC) que determina a rotulação de alimentos com aviso sobre a presença do corante amarelo tartrazina. O alerta deve ser assim: "Este produto contém o corante tartrazina, que pode causar reações alérgicas em pessoas sensíveis".  A Anvisa já conseguiu incluir o alerta nos rótulos de medicamentos (sinceramente, pra quê xaropes e comprimidos precisam ter corantes?), mas a indústria de alimentos simplesmente inclui o aditivo na lista de ingredientes.

O que o projeto talvez não abranja são estas fabricações artesanais de farinhas e tucupis e aí reside um perigo maior porque o corante é adicionado sem nenhum critério (a indústria, não por pensar na nossa saúde, mas por uma questão de custo, deve ter lá algum e está de certa forma sujeita a alguma fiscalização).  Durante uma visita que fiz à Nazaré das Farinhas na Bahia, vi que muitos farinheiros também colocam corante nas farinhas. Muitas vezes, cúrcuma, mas também corantes artificiais. No Mercado da Lapa mesmo tem farinha bem amarelo-corante. Alguns vendedores teimam em me dizer que aquilo é da própria mandioca e que farinha de copioba é amarela e outros chegam a inventar: é uma planta chamada copioba,  que é amarela,  e eles a adicionam à farinha. Vejam sobre a farinha de copíoba aqui.

Sobre o amarelo tartrazina, que está relacionado não só a reações alérgicas mas à hiperatividade de crianças, já falei aqui (você poderá ver um artigo que saiu na revista The Lancet).  Veja ainda o informe da Anvisa sobre o corante.

Em Rio Branco comi um caldo de rabada com tucupi que estava delicioso. Certamente foi usado um desses tucupis excessivamente coloridos, mas eu não sabia,  achei bem gostoso e quero repetir a dose quando voltar para lá - e ainda tem o pato. Então, a questão não é tirar do mercado o produto artesanal de forte tradição, mas garantir a qualidade - e também garantir a tradição, afinal tucupi que é tucupi de verdade não leva nada além do sumo da mandioca e talvez algum tempero. O negócio é dar treinamento para os manipuladores de alimentos. Será que isto é difícil de conseguir? Não valeria para os queijos e outros produtos artesanais? Ainda acredito que podemos ter bons produtos assim.

Em tempo: lá mesmo em Acrelândia fiquei sabendo que há um outro aditivo chamado de incenso, que não descobri do que se trata,  usado em garrafadas e xaropes. Falam-se dele como um pozinho branco (talvez um comprimido na forma de um cone de incenso) e que "não faz mal, não, todo mundo usa, é só adicionar e o xarope não estraga nunca". Bactericida? antifúngico? alguém conhece?





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