Mel de Jataí, resposta à charada de ontem
Comida Saudável

Mel de Jataí, resposta à charada de ontem


Ontem tive problemas com tempo e conexão. Peço desculpas, já que prometi a resposta da charada.

Um potinho de cera com mel de jataí, apoiado num mini pratinho de cerâmica do meu amigo ceramista Rui Gassen - que, aliás, está no caderno Paladar (O Estado de São Paulo), de hoje, que mostra um colar montado por mim com mini panelinhas feitas por ele. Fófis.




Pelo que se pode ver nos comentários do post anterior, quase todo mundo acertou a charada: um favinho de mel de abelhas nativas sem ferrão - neste caso, especificamente, de abelhas jataí. Obrigada, amigos, pela participação! Prometo dificultar o enigma da próxima vez. Este foi fácil demais!

Meus amigos Rui Gassen e Mariângela Dib, de Porto Alegre, cuidam caprichosamente de algumas caixinhas com estas abelhas mansas. Ano a ano eles vão marcando na caixa o peso, para calcular quando de mel vão conseguir faturar. Rui abriu uma das caixas para nos mostrar o conteúdo. Ganhei, assim, este potinho com o mel ácido quase líquido, que daria para tomar de mini-canudinho. Mas bebi como um fino licor, no próprio copinho de cera (que depois mastiguei para não perder nada).

Jataí é o nome da abelha sem ferrão que produz este mel de consistência mais fina. Aclamado como medicamento para resfriados e cataratas, tem feito sucesso na cozinha. Funciona como uma caldinha perfeita para um pudim, bolo, sorvete. Não precisa de tempero nem preparo algum. Chega prontinho.
Embora não se tenha nenhuma comprovação científica sobre seus poderes medicinais para o organismo humano, pesquisadores brasileiros já comprovaram em laboratório que ele consegue matar ou inibir o crescimento de várias bactérias. Em alguns países da América do Sul ele é usado na medicina popular como remédio para qualquer tipo de afecção ocular.

Há não muito mais que um século, a abelha européia (Apis Mellifera) foi trazida ao Brasil , e a africanizada, nasceu aqui por cruzamento acidental daquela com variedades da Apis trazidas da África. São as abelhas mais produtivas, despertam maior interesse econômico mundial e são amplamente estudadas. Já as abelhinhas sem ferrão (na verdade, atrofiados), como a Jataí, pertencem a uma outra sub-família, a Meliponinae e não à Apinae como a européia e africanizada.
Uma curiosidade é que quem cria jataí (Tetragonisca angustula) ou qualquer abelha sem ferrão é chamado não de apicultor, mas de meliponicultor. Portanto, meu amigo Rui Gassen é não só um de ceramista profissional, mas ainda um meliponicultor amador (como tudo o que faz, no melhor sentido que amar algo pode ter).
Pouco produtiva e pouco rentável, a abelha Jataí é também pouco conhecida apesar de ser quase que exclusividade dos Trópicos. Seu mel é escasso e difícil de se encontrar. Em compensação, alcança alto preço no mercado, principalmente porque é vendido como medicamento. Enquanto cada colméia de Apis mellifera produz cerca de 20 quilos por ano, a Jataí produz, quando muito, 1 quilo no mesmo período. Em compensação, não tem ferrão e é muito mansa, o que torna seu manuseio mais fácil. Nem todas as abelhas sem ferrão são indefesas e boazinhas. Muitas usam artifícios como enroscar no cabelo, beliscar com a mandíbula e penetrar no nariz e ouvido do inimigo que inclui aqueles que querem roubar-lhes o mel. Se a jataí não usa nenhuma arma contra predadores, por outro lado parece se proteger de fungos e bactérias produzindo substâncias que impedem o desenvolvimento desses microorganismos. Por isso seu mel é tão cobiçado como remédio.

Só o Brasil possui dezenas de espécies de abelhas nativas (ou indígenas) com importante benefício para a polinização das espécies vegetais da nossa flora. Já posuiu centenas, mas algumas foram extintas. Elas geralmente são menores que as abelhas Apis e se diferenciam também no comportamento e forma de construção das colméias.
Enquanto as Apis fabricam favos sempre verticais, as abelhas nativas, incluindo a Jataí, Irapuã, Mombuca, Moçabranca, Mandaçaia, Urucu, Jandira, Mirim e Mosquito, têm favos dispostos horizontalmente. Elas recolhem néctar e pólen mas armazenam o mel em quantidades muito pequenas. Normalmente essas abelhas são criadas por amadores ou institutos de pesquisa, de forma quase artesanal. Geralmente estabelecem suas colônias em troncos ocos, galerias no solo, frestas e até em caixas de luz. Elas usam cera, própolis e barro como material de construção. Muito mansa, a jataí adapta-se bem até na cidade, nas varandas de apartamentos e pode transformar-se em divertido hobby. Com as caixinhas do Rui, fiquei bastante animada. Uma vez, já tentei tirar uma colmeia delas do escapamento do carro, mas não teve acordo. Mas em breve terei aqui uma criação- as jataí costumam frequentar as florezinhas de manjericão do meu jardim por volta das 11 horas da manhã. Seduzi-las para uma caixinha com perfume de capim-santo não vai ser tarefa difícil.

Se você quiser comprar por aí, vai perceber que mel de jataí não é artigo fácil de encontrar. Há até marcas de ?mel? como ?jataí do Norte? que pode enganar o consumidor por não ser nem mel nem de jataí. Uma rápida olhada no rótulo já desfaz a dúvida. Trata-se de xarope feito com açúcar e essência de mel. Deste tem aqui perto, no mercado da Lapa. E tem gente que leva gato por lebre, porque o próprio vendedor diz que é mel de jataí. O próprio preço pode ser um indicador. Como o produto é escasso, geralmente é vendido em pequena quantidade e com preço muito superior ao do mel comum (cerca de 5 vezes mais). Pode ser encontrado em lojas de produtos naturais ou encomendado diretamente dos meliponicultores. Cuidado ao adquirir mel de abelhas nativas, pois algumas espécies produzem méis tóxicos como os da abelha limão (ela usa como fonte protéica a carcaça de animais mortos - eca!).

Por ter mais umidade, esse mel fermenta mais rapidamente. Se adquirir grande quantidade, deve ser guardado em geladeira ou congelado para ser usado na cozinha. Se congelar, faça-o dividindo em pequenas porções. O ideal, para manter suas propriedades, é consumi-lo sem aquecer a mais de 40 ºC.
Experimente comer palmito Juçara cru banhado com mel de Jataí. Os Guarani comem assim o palmito. Uma delícia!!




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